quinta-feira, 21 de outubro de 2010

Desafios da Tradução - Fabiana Camargo

Ela esbanja sorriso e simpatia. Atenciosa, a professora Fabiana Camargo tem mestrado em Literatura e fala um pouco sobre os desafios de ser um tradutor-revisor e o que fazer para não ser apenas mais um no mercado.


1) Qual o maior desafio de um tradutor-revisor?
O tradutor que também se formou como revisor, como é o meu caso, é um profissional extremamente exigente com seu texto final, com a qualidade textual de seu trabalho. Seu maior desafio é produzir um texto impecável, que prescinda de outros olhos revisores.
Sabemos que esta é uma prática extremamente arriscada que o tradutor trabalha sob pressão de prazos, e as chances de erro são muito grandes. Enquanto a maioria dos tradutores está mais voltada para a qualidade tradutória propriamente dita, o tradutor que é revisor ou escritor é mais detalhista, mais cuidadoso com a língua portuguesa; entre ele e o texto há uma espécie de namoro, mas, com isso, ele pode levar mais tempo para finalizar um trabalho. De todo modo, um bom profissional de tradução, com ou sem experiência em revisão, sabe que ambos aspectosqualidade tradutória e qualidade textual – devem ser sempre considerados na feitura de um bom trabalho.
Em março deste ano, no I Encontro Internacional de Língua e Tradução da UGF, em SP, tivemos o prazer de assistir a uma videoconferência com Mario Vargas Llosa, na qual o escritor peruano comenta sobre sua profunda admiração por seu tradutor para o francês. Segundo Vargas Llosa, este tradutor conhece tão bem o francês, que seu texto final não parece um texto traduzido; é como se tivesse sido criado naquele idioma. Ou seja, quanto mais invisível o tradutor, melhor será seu texto final; quanto maior seu conhecimento da língua materna, mais chances de alcançar esta meta. Um bom revisor costuma conhecer bem a sua língua, seu trabalho é fundamental e até pode salvar um texto mal traduzido. Tanto melhor se o tradutor tiver essa formação. Saltos e deformações frequentes nos trabalhos de tradução podem ser evitados por um tradutor-revisor ou por um tradutor amparado por uma boa equipe de revisão.
2) O que é mais difícil: tradução técnica ou literária?
Sem dúvida, a tradução literária é a mais complexa de todas porque, em geral, este tipo de tradução envolve um conhecimento de mundo muito maior, mais ligado às culturas e à História, como podemos observar na frase de José Saramago, quenome a esta mesa. O tradutor literário universaliza a obra original no momento em que a insere noutra cultura e transcende os limites de sentido e geográficos. Na considerada boa literatura entram inúmeras referências históricas e culturais que, quando não reconhecidas pelo tradutor, não pesquisadas devidamente ou até suprimidas, podem comprometer seriamente o entendimento da obra original.

Mas, se alguém me pedir para traduzir um manual de medicina ou mesmo de informática, vou achar extremamente difícil porque, claro, não é minha área. As traduções não literárias que fiz não são traduções técnicas propriamente ditas, mas as assim chamadas de “não-ficção”: de enciclopédias, de filosofia, arte, saúde, artigos, de entrevistas etc. Cada uma tem sua peculiaridade e seu grau de dificuldade. O tradutor deve procurar descobrir a área com que possui mais afinidade, de acordo com seus interesses e conhecimento de mundo. Agindo assim, ele terá muito mais chance de fazer um bom trabalho.
Para os que desejam traduzir literatura, sugiro que comecem pela tradução de ficção comercial, pelos famosos best-sellers, que não necessariamente constituem um gênero menor, basta conferir a série Harry Potter, ou a trilogia de Stieg Larson em Os homens que não amavam as mulheres, ambas obras de ficção comercial de extraordinária riqueza.

3) O que dizer para um tradutor iniciante para que ele seja bem sucedido no mercado?
Antes de tudo, ele tem de conhecer muito bem e estudar a sua língua materna, a língua de chegada, para a qual está traduzindo a obra. Não basta saber a língua estrangeira, a língua de partida. Ele também precisa conhecer bem a língua e a cultura do país estrangeiro que está traduzindo, e, sobretudo, especializar-se em tradução. Conhecer as ferramentas, os programas, as diferentes modalidades de tradução. Na época de Monteiro Lobato, por exemplo, quando a tradução dava ainda seus primeiros passos, não se exigia tanta profissionalização, mas, hoje, ninguém começa traduzindo um grande autor e nãomais espaço para amadorismo. Seja por meio de uma pós-graduação lato sensu, como a nossa, seja por cursos stricto sensu, de mestrado e doutorado, o tradutor deve buscar aprimorar-se, pois o mercado está absorvendo e exigindo profissionais cada vez mais capacitados. E, uma vez conseguida a primeira oportunidade de trabalho, deve cumprir os prazos indicados pelo editor